Porque queremos que as nossas crianças sejam cada vez mais pensantes e espíritos críticos, falámos com o Tomás Carneiro, que irá colaborar com o nosso blog de uma forma contínua através da partilha das chamadas “Sessões Comentadas”.
Nesta primeira colaboração, vamos apresentar o Tomás Carneiro e conhecer um bocadinho do seu trabalho.
Esperamos que gostem tanto, quanto nós!
Quem é o Tomás Magalhaes Carneiro e o que faz?
O meu nome é Tomás Magalhães Carneiro, nasci em Évora em 1977
mas com seis meses trouxeram-me para o Porto cidade onde vivo desde então.
Não sou professor de filosofia no sentido em que não ensino filosofia mas procuro levar as pessoas (adultos e crianças) a filosofar comigo. Dinamizo sessões de Diálogo Filosófico em espaços públicos (Cafés Filosóficos, Ciclos de Leituras Filosóficas, Formações de Diálogo Filosófico na Sala de Aula) e em escolas e jardins de infância (Projectos Jovens Filósofos e Filósofos a Brincar).
Recentemente, fundei com um amigo músico o "Clube Filosófico do Porto" que pretende aproximar a filosofia da cidade, o local onde nasceu há 2500 atrás, em Atenas com Sócrates.
Não sou professor de filosofia no sentido em que não ensino filosofia mas procuro levar as pessoas (adultos e crianças) a filosofar comigo. Dinamizo sessões de Diálogo Filosófico em espaços públicos (Cafés Filosóficos, Ciclos de Leituras Filosóficas, Formações de Diálogo Filosófico na Sala de Aula) e em escolas e jardins de infância (Projectos Jovens Filósofos e Filósofos a Brincar).
Recentemente, fundei com um amigo músico o "Clube Filosófico do Porto" que pretende aproximar a filosofia da cidade, o local onde nasceu há 2500 atrás, em Atenas com Sócrates.
Aceitei o convite para colaborar neste blog pois interessa-me
partilhar com os pais a alegria e a força criativa que sinto ao desenvolver
sessões de Filosofia com Crianças. Regularmente publicarei aqui alguns
exercícios e sessões, assim como indicações e técnicas para estimular e
orientar um Diálogo Filosófico com as crianças.
Tenho compilado estes exercícios e técnicas numa página do
meu site a que dei o nome de CAIXA DE PANDORA – http://filosofiacritica.wordpress.com/caixa-de-pandora/
Espero que este seja um espaço para perguntas, comentários, críticas e sugestões e espero também que o que aqui for publicando sirva para cultivar o espírito filosófico dos leitores: o espírito do ignorante que se sabe ignorante e se esforça por deixar de o ser.
Espero que este seja um espaço para perguntas, comentários, críticas e sugestões e espero também que o que aqui for publicando sirva para cultivar o espírito filosófico dos leitores: o espírito do ignorante que se sabe ignorante e se esforça por deixar de o ser.
APAIS - Começaria por lhe pedir que nos explicasse o que é a Filosofia para Crianças?
Tomás - Prefiro a designação Filosofia com Crianças pois transmite melhor o que se passa
numa sessão de Filosofia: uma experiência de Diálogo Filosófico com as
crianças a partir das suas próprias ideias e não uma transmissão de ideias e
valores (de outros filósofos ou do professor) para as crianças.
Por outras palavras, se o ensino tradicional da filosofia se
insere num paradigma da transmissão de
ideias filosóficas, a Filosofia com Crianças insere-se num paradigma da experiência do
filosofar.
APAIS - De
que forma a mesma é importante para as crianças – hoje e no futuro?
T - Qualquer pessoa reconhece que aprender a pensar é importante em
qualquer área da vida humana e facilmente reconhecerá que a melhor forma de se
aprender a pensar é... pensando. Numa sessão de Filosofia com Crianças
procuramos criar esse espaço para o pensamento livre e autónomo que cada um
deve fazer por si mesmo e em contacto com as ideias dos outros.
O Diálogo livre, tranquilo e responsável com os nossos semelhantes
é a forma mais natural de aprender a pensar. Num Diálogo aprendemos a pensar em
cooperação com os outros, ouvindo os outros, esforçando-nos por compreender o
que dizem e por que o dizem, aceitando as suas críticas às nossas ideias e
aceitando também mudar de ideias quando nos corrigem e nos mostram que não
temos razão.
Estas atitudes (humildade, empatia, interesse pelo outro,
responsabilidade, etc.) são "atitude filosóficas" mas também atitudes
cívicas, sociais e humanas de inquestionável valor para qualquer pessoa
(criança ou adulto) e é preocupante constatar que essas atitudes são muito
raras.
O grande contributo da Filosofia com Crianças para o cultivar
destas atitudes fundamentais está, exatamente, em criar situações de Diálogo em
que as crianças são convidadas a ouvir o outro, a reconhecer e aceitar a sua
diferença, percebendo que o outro pensa diferente de nós mas que poderá ter
boas razões para o fazer. Perceber o nosso lugar no mundo passa por perceber
que os outros têm também um lugar no mundo.
APAIS - Como
se desenvolve / se processa uma sessão?
No entanto, para conseguirmos que as crianças dialoguem entre si
não basta fazer com que esperem de dedinho no ar pela sua vez de falar. Para
conseguirmos que as crianças dialoguem entre si é preciso que as crianças
queiram dialogar, i.e., é preciso que queiram verdadeiramente ouvir o que o outro
tem para dizer e não porque as regras do diálogo o exigem (não falar na vez do
outro, esperar que o outro acabe de falar, levantar o dedo para falar, etc.).
Cumprir essas regras é necessário para o bom funcionamento de um
Diálogo, mas não é suficiente. É necessário ainda reconhecer que é bom para nós
ouvir o que o outro tem para nos dizer.
Conseguir este "patamar mínimo" de Diálogo entre as
crianças é um trabalho muito demorado mas, ao mesmo tempo motivador e aliciante
e que deve ser a preocupação principal de quem começa a fazer Filosofia com
Crianças.
APAIS - Qualquer pessoas pode realizar sessões de Filosofia com as
Crianças?
T - Pelo que acabei de escrever percebe-se claramente que não, da
mesma forma que nem todas as pessoas podem realizar sessões de Música com
Crianças, por exemplo.
Uma sessão de Filosofia com Crianças não é uma aula de filosofia
mas também não é uma sessão de conversa mais ou menos "solta" sobre
temas filosóficos, à semelhança das conversas que temos com os nossos amigos no
café. Uma sessão de Filosofia com Crianças é muito exigente, tanto para as
crianças como para o professor (facilitador) pois o que se pretende é, exatamente,
evitar que o Diálogo se torne numa conversa inconsequente em que cada um
expressa o que muito bem entende.
Saber dialogar é uma arte como outra qualquer e, nesse sentido, se
nem todas as pessoas estão preparadas para ensinar as crianças a pintar, a
fazer desporto, a falar inglês ou a tocar um instrumento, quem não é capaz de
dialogar também não será capaz de ensinar a dialogar. Uma regra de ouro em
que acredito é que as crianças não fazem o que lhes dizemos para fazer mas
fazem aquilo que efetivamente fazemos. Ou seja, por muito que lhes digamos que
têm de ouvir os outros, dialogar entre si, respeitar as diferentes opiniões,
pensar por si mesmos de forma autónoma e responsável, etc. se nós que lidamos
com elas diariamente não o praticamos com elas diariamente as crianças não se
vão ouvir, não vão dialogar, não vão pensar por si mas, antes, vão esperar
pelos pais ou pelos professores para pensarem por elas, para dialogarem por
elas, para ouvirem por elas.
O espaço de Diálogo criado numa sessão de FcC é um espaço de
verdadeira democracia (em que a opinião de todos vale exatamente o mesmo) e
basta um pouco de realismo para vermos que a sala de aula ou mesmo o ambiente
familiar não é, neste sentido, um espaço democrático. Há uma hierarquia
estabelecida em que há conhecimentos a serem transmitidos e a adquirir, valores
a conhecer e a respeitar, etc. E é natural e até mesmo necessário que assim
seja. Mas o espaço da sessão de Filosofia não é um espaço natural. A sessão de
Filosofia é um espaço artificial, uma espécie de “laboratório de ideias” em que
tudo é possível. Como trabalhamos sobretudo com base em hipóteses uma sessão de
Filosofia com Crianças é um espaço aberto à livre, mas rigorosa, especulação,
onde tudo pode ser posto em causa desde que devidamente justificado. Fazer
Filosofia com Crianças é aceitar correr o risco de deixar as crianças pensarem realmente por
elas próprias, por muito estranho e perigoso que isso possa parecer aos pais, a
alguns pedagogos e à própria consciência moral do professor de filosofia com
crianças. Este é o desafio (o maior desafio) que se coloca a quem está disposto
a fazer Filosofia com Crianças: deixar de existir para as crianças começarem a
existir.
Se não aceitar correr esse risco e se não tiver a humildade para
“deixar de existir” estará a fazer Moral com Crianças, Educação Cívica com Crianças
ou Pedagogia com Crianças ou, na pior das hipóteses, estará a dar uma aula de Filosofia,
mas não estará a fazer Filosofia com Crianças.
APAIS- Com
que regularidade se deve realizar uma sessão?
APAIS -
Quantas crianças podem participar nas mesmas?
T – Uma turma normal entre 15 e 25 alunos.
APAIS - Qual
a duração das sessões?
T – Depende sempre da maturidade do grupo. Hoje mesmo fiz uma
sessão de filosofia com alunos de cinco, seis anos da Escola Infantil a Flor,
no Porto. Durante 1h30m discutimos “o que escolhemos e o que não escolhemos”
(os pais, os amigos, estar zangado, estar doente, os sonhos, os pensamentos, etc.).
Foi uma sessão muito intensa onde nem demos pelo tempo a passar. No entanto,
quando comecei a trabalhar com este grupo no ano passado, as primeiras sessões
não duravam mais que 30 minutos.
Numa sessão de FcC não importa a quantidade de minutos mas a
qualidade das ideias.
APAIS -Os
grupos podem ser heterogéneos ou é conveniente as idades serem idênticas?
T – Com os meninos mais novos (3-4 anos) é bom mantê-los num grupo
homogéneo. À medida que amadurecem e aprendem a dialogar é muito interessante
misturá-los em grupos com crianças de várias idades e ver como se ajudam
mutuamente a resolver problemas filosóficos “bicudos”.
APAIS- Que
sugestões nos deixa para o usarmos no nosso dia a dia com os nosso filhos?
T – Nas formações que dou a professores do ensino básico e
secundário que querem aprender a cultivar o Diálogo com os seus alunos em sala
de aula digo-lhes que para o fazerem devem deixar de ensinar, de falar, de
explicar para as crianças começarem a pensar, a falar, a explicar, numa
palavra, a Dialogar. Ou seja, devem deixar de ser professores.
Uma vez que me pede uma sugestão para os pais, por coerência só
posso deixar a sugestão mais difícil de todas: para cultivarem o Diálogo
Filosófico com os vossos filhos devem… deixar de ser pais!
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